13/09/11

Dia 19 - A Montanha

1 de Setembro, 2011
Maseru, Lesotho

Acordar e ver uma boa paisagem é sempre bom. Acordar e ver as montanhas de Drakensberg é fantástico! O aspecto cinematográfico de ontem à tarde mantém-se e cada elevação agora brilha com os primeiros raios de sol dando uma sensação de nada ser real. Parece um cenário que está montado por detrás da minha mesa do pequeno-almoço. Surreal era também o pequeno-almoço, tal era a variedade e qualidade dos produtos oferecidos. Foi sem dúvida dos melhores que já foram servidos nestas últimas semanas e aproveitei para levar umas bananas para se ir comendo durante o dia.

Logo à saída do hotel tínhamos à nossa espera uma secção especial cronometrada. No início tudo corria bem, mas acabou por ser um desastre aqui para o "24". Mais ou menos a meio da prova, e depois de já termos feito um meio peão numa curva, o carro escorregou e foi até à berma. Por sorte não batemos em nada, mas para mim estava a parecer perigoso demais para um passeio de clássicos. Acabamos por chegar ao fim com 2 minutos de penalização (o que não foi muito quando comparado com os outros carros) e um pneu furado (só descobrimos no fim, mas provavelmente furou quando o carro fugiu para a berma). Mudar o pneu foi tudo menos complicado, a experiência adquirida com os problemas na suspensão e travões tornou-me um especialista em trocar pneus.

Decididos a poupar o carro para os 4 dias que faltam embarcamos numa viagem/passeio pelas montanhas. Seguindo devagarinho foi possível continuar a apreciar a paisagem até Maseru, a capital do Reino do Lesoto. Passamos a fronteira sem qualquer problema, apenas foi preciso preencher o típico papel a informar quem somos, de onde vimos e para onde vamos. A organização tinha preparado um almoço num restaurante que se situava no topo de uma montanha e nós estávamos a caminho quando... acabou a gasolina. Era uma situação que eu já esperava, sendo que desde de Moçambique o meu Pai só metia a gasolina estritamente necessária para se chegar a uma outra bomba de gasolina, ao contrário de toda a gente, que mal podia enchia o depósito. Pelas contas dele teria tudo dado certo, não fosse a bomba de gasolina escolhida estar fechada e então, 40 km depois (como podem ver estava tudo contado à gota) o carro deu de si. Por sorte vinha atrás de nós o Daniel Schoch que estava (obviamente) precavido com dois jerricans cheios do precioso líquido. O que mais me custou não foi o estar parado à espera de alguém que nos arranjasse a gasolina, mas sim o facto de termos perdido o almoço por causa disso!



Até amanhã

09/09/11

Dia 18 - Uma Nova África

31 de Agosto, 2011
Cathedral Peak, Drakensberg Mountains, África do Sul

Hoje voltou-se a acordar cedo. Tão cedo que saímos antes do pequeno almoço ser servido. Pela frente tínhamos duas fronteiras e mais de 600km para fazer. À partida do Kruger, foi possível ver uma família de girafas que tomava o pequeno almoço perto da estrada, para entusiasmo de todos os participantes e para mim uma última boa impressão do Parque.

As duas fronteiras que cruzamos foram para entrar e sair da Suazilândia (acho que nunca passei tão pouco tempo num país), apenas para percorrer 180km. Não ocorreram quaisquer problemas, as fronteiras tinham pouca gente e em 30 minutos estava tudo tratado. Dos 180km que percorri neste pequeno reino, os primeiros 40km eram campos agrícolas, 100km de reservas naturais e os últimos 40km eram novamente campos agrícolas. Duas horas depois de entrarmos, estávamos a sair. Embora a nossa passagem fosse curta, tive tempo para ler um pouco sobre a história do reino da Suazilândia. Nunca imaginei que este pedaço de terra fosse reconhecido como um reino independente desde o século XIX e que desde sempre se manteve à parte dos grandes conflitos na região da África do Sul.

Ao entrarmos novamente em território sul africano estávamos já distantes da savana do Kruger e dos terrenos cultivados da fronteira. Aqui as planícies, colinas e pequenos montes, característicos desde Dar Es Salaam, dão lugar a montanhas majestosas e vales enormes. Estamos nas montanhas de Drakensberg, uma famosa região montanhosa sul africana, procurada por amantes de hiking e natureza. O roadbook informa que terá sido nesta região que J.R.R. Tolkien terá passeado e inspirado para a criação da sua Terra Média. O nosso hotel localiza-se no fim de uma estrada, no meio das montanhas, e tem o Cathedral Peak nas traseiras, o que lhe dá um aspecto cinematográfico quando se chega de carro. Segundo o porteiro algumas das montanhas estavam cobertas de neve até cerca de duas semanas atrás e hoje é possível vislumbrar pequenos pontos onde o gelo persiste. É também o ponto de partida para muitos dos trilhos usados pelos hikers e a julgar pelas fotografias expostas no lobby, promete experiências únicas.

À noite ficou frio e pela primeira vez desde que estou neste continente vesti o polar. Só agora, e apesar de estar todos os dias a contar quilómetros no carro, me apercebi que estou a ir para Sul, que estou a deixar o calor dos trópicos. O dia de hoje foi bem comprido, acordamos cedo, passamos por duas fronteiras, percorremos quase 700km e terminamos num hotel confortável, amigável e num local privilegiado. Isto é uma nova África e tal como a anterior, também começo a gostar dela.

08/09/11

Dia 17 - A Vida na Savana

30 de Agosto, 2011
Kruger Park, África do Sul

O acordar hoje foi um bocado complicado: talvez por saber que só irei descansar novamente daqui a uma semana ou talvez pela cama do Polana ser fantástica. O que é certo é que custou a levantar e entrar novamente no carro. Hoje foi o dia mais curto da prova, com apenas 130km para fazer entre Maputo e o Kruger Park, na África do Sul. A viagem acabou por decorrer sem problemas, apesar de pelo meio termos a fronteira. Do lado moçambicano 1200 meticais pouparam-nos de uma fila enorme e no lado sul-africano a eficiência de um país mais evoluído tratou do resto.

Após se cruzar a fronteira fica uma sensação de se estar a deixar África para trás e de estarmos a entrar num espaço completamente diferente. Os últimos quilómetros em Moçambique deixam uma imagem pobre do país, casas em adobe, sem eletricidade e num ambiente semi-árido. A África do Sul é o oposto. Após se cruzar a fronteira somos carregados (visualmente) com campos plantados, placares de publicidade, diferentes tonalidades de verde, ruas arranjadas e carros de outras marcas que não a Toyota. Foi também preciso chegar à África do Sul para perceber que aqui o Sol não passa pelo Sul, mas sim pelo Norte.

A pouco mais de 30km da fronteira entramos no Kruger Park, uma das mais famosas reservas de vida selvagem em África. O parque permite a circulação de veículos, mantendo as suas estradas em óptimas condições, e permitindo aos que por lá passam cruzarem-se com elefantes, girafas, rinocerontes, impalas, entre outros. Ao chegarmos ao nosso lodge foi-nos servido um almoço óptimo e durante a tarde fomos fazer outro game drive. Sempre ouvi falar que o Kruger era um dos melhores lugares para se fazer safaris, com uma variedade imensa de animais e, sobretudo, fáceis de se encontrar. Confesso que com essas expectativas e as óptimas experiências do Selous, preparei-me para algo que nunca aconteceu! Aqui os jipes não podem sair dos trilhos, a paisagem era desoladora, parecia que estávamos a atravessar um deserto, e os poucos animais que vimos estavam muito ao longe. Grande parte do percurso era junto à fronteira do parque com terrenos cultivados sul-africanos, o que me deu mais a sensação de que nada daquilo era genuíno. Por certo estou a ser demasiado exigente, mas este era o meu terceiro game drive em duas semanas e não gostei nada (o Kruger é um parque enorme e portanto poderei ter estado na sua pior parte, acredito que haja melhores locais que este). Selous vale por uma experiência única como estar a 1 metro de leões a cometem um búfalo e a Gorongosa vale pelas paisagens fantásticas.

O factor mais positivo deste desvio ao Kruger foi o alojamento. Era dividido em tendas e decoradas num estilo colonial. Não fosse a eletricidade e estaria como no início do século XX. O campo era muito pequeno e alberga 10 pessoas no máximo (o grupo inteiro dividiu-se por 3 acampamentos diferentes). O edifício principal era também uma tenda, dividida em sala de jantar, estar e cozinha, com uma varanda fantástica sobre a savana. No fim do almoço apareceu um elefante junto à varanda e por lá ficou a deliciar-se com umas folhagens, enquanto se deixava fotografar por 10 humanos.

Até amanhã

07/09/11

Dia 16 - O Colonialismo

29 de Agosto, 2011
Maputo, Moçambique

Hoje foi o último dia de descanso até chegarmos à cidade do Cabo. O dia acordou cinzento, tal como ontem, o que descartou a possibilidade de um dia na piscina. O meu Pai acabou por ir com o carro a um mecânico, ver se conseguia resolver de vez o problema no amortecedor, e eu fiquei-me pelo hotel.

A meio da manhã fui com um grupo de outros participantes no rally a um jardim a cerca de 200 metros do Polana, onde estava a decorrer uma feira de artesanato moçambicano (ou africano). As principais peças que por lá se vendiam eram estátuas de todos os feitios e tamanhos, feitas em pau preto embora a maioria aparentasse tratar-se de madeira normal com uma boa dose de graxa por cima. Havia por lá dois ou três indivíduos que estavam realmente a trabalhar em madeira, mas será tudo marketing? Pelo que se diz a China é um dos maiores produtores de artesanato africano, chegando mesmo a ter melhor qualidade que os verdadeiros produtos. Depois de ver dezenas de tipos a venderem o mesmo tipo de estatuetas, tabuleiros ou colares, concluo com muita tristeza que esses boatos serão verdadeiros, e que haverá um grande armazém chinês nos arredores de Maputo que abastece todos estes tipos com artesanato made in China. À hora do almoço foi a vez de provar uma feijoada, feita no hotel a pedido do Giancarlo (um participante italiano que é louco por feijoada) e estava óptima.

Da parte da tarde o grupo português arranjou 2 táxis e foi explorar a baixa da cidade, onde aproveitei para apreciar um pouco mais do colonialismo português. A nossa primeira paragem foi a estação de comboio de Maputo, inaugurada em 1910, e considerada pela revista Travel&Leisure uma das mais bonitas do mundo. Este edifício funciona também como um pequeno museu, onde estão expostas duas locomotivas importantes para a história dos caminhos de ferro moçambicanos. A paragem seguinte foi o mercado municipal. Actualmente funciona no exterior do edifício, que se encontra em reparações depois de um incêndio ter destruído uma parte, e é tudo o que se pode esperar de um mercado africano. É confuso, um pouco sujo, com muita gente e, acima de tudo, divertido. Logo à entrada estão as peixeiras, quase em cima da rua e com os peixes pousados em balcões cinzentos, sem qualquer tipo de refrigeração ou gelo. Quanto mais nos embrenhamos no mercado mais confuso fica, tendo de um lado um tipo a vender cestos, do outro uma frutaria e em frente o tipo da hortaliça a regar as couves para lhes dar um ar de frescura. Temos também a zona das perucas, os quiosques de produtos de beleza, balcões de pronto a comer (onde é mais provável uma desinteria que uma refeição saudável) e gaiolas com pássaros. É um autêntico labirinto de cores, cheiros e sons.

Vivos e com aparente boa saúde chegamos ao hotel e de banho tomado fomos jantar ao famoso restaurante Costa do Sol, um local icónico em Maputo, onde comi os melhores camarões de sempre. Simplesmente deliciosos. Mas como tudo o que é bom acaba rápido, lá se foi o dia de descanso e amanhã é dia de acordar cedo.

Até amanhã

04/09/11

Dia 15 - A Capital

28 de Agosto, 2011
Maputo, Moçambique

Esta noite choveu. Não foi uma "murrinha" como na Gorongosa nem uns chuviscos como no Kilimanjaro, mas sim a minha primeira chuva africana. A julgar pelo som que se sentia na minha cabana sobre o mangal parecia uma tempestade tropical, mas de manhã deu para ver que foi uma chuva como outra qualquer.

Ainda antes de deixarmos Inhambane percorremos as ruas da cidade, em busca de uma bomba de gasolina, e pude ver alguns exemplos da arquitectura colonial portuguesa, como é o caso do cine-teatro tofo (fotografia a publicar quando conseguir). Lá encontramos a estação de serviço e com o depósito cheio era então altura de partir para a capital de Moçambique, Maputo. A viagem correu bem, a estrada é bastante boa, passando por algumas povoações como a vila Piri-Piri (nome dado por mim a uma vila cuja especialidade é a venda de Piri-Piri, tal é a quantidade de bancas a venderem tal produto) ou a aldeia dos Cajús (nome dado por mim pelas mesmas circunstâncias). O mercado ou a venda de rua, em especial aos condutores, é uma realidade engraçada nesta parte de África. Já passei por pessoas a venderem de tudo aos carros que passam, desde galinhas e cabras, a piri-piri, cajú, fruta, carvão, gasolina engarrafada, etc. Toda e qualquer pessoa que passa é uma oportunidade de negócio. Se há assim tanta gente a parar não sei (parámos por uma vez para comprar um saco de cajú), mas é certo que já vi muitos camionistas a levarem cabras vivas e presas aos atrelados.

A meio do caminho fica uma pequena vila chamada Xai-Xai (nome dado por outra pessoa qualquer) e que segundo o meu Pai era nos anos 60 e 70 uma espécie de Cascais. Hoje em dia o centro da vila continua bem preservado e em funcionamento, mas a zona da praia está totalmente degradada. Foi também preciso chegar a Xai-Xai para ver pela primeira vez em África um dos símbolos do mundo ocidental, o fast-food, e neste caso específico um KFC. É sempre bom quando encontramos algo que nos é familiar. Ao entrar nos arredores de Maputo encontrei uma realidade da do resto de Moçambique, o trânsito. Nas estradas do interior é inexistente, no litoral há sobretudo camiões e autocarros e em Maputo há de tudo. Demorou bastante até conseguirmos ultrapassar a circular e entrarmos no centro da cidade. Para auxiliar a confusão, a capital vai receber dentro de uma semana (começa dia 3 de Setembro) os Jogos Africanos, uma espécie de jogos olímpicos mas para os países africanos. É certamente um evento importante e poderá revelar-se uma oportunidade para Moçambique mostrar as suas qualidades.

Finalmente chegamos ao Polana, o mais famoso hotel de Moçambique e, quando foi construído nos anos 20, um dos melhores hotéis da Europa. Embora tenha sofrido obras de restauro nos últimos anos, manteve a fachada original e por dentro a decoração é bastante elegante. Um pouquinho mais de glamour e certamente transportaria os seus hóspedes no tempo até aos anos 40, 50 e 60. Não é difícil imaginar este edifício como sendo um ponto de encontro de pessoas famosas que visitavam África.

02/09/11

Dia 14 - O Purgatório

27 de Agosto, 2011
Inhambane, Moçambique

Esta manhã deixamos o Paraíso. Ficou a vontade de voltar, pois como seria de esperar todos nós queremos sempre o melhor. Apanhamos então o avião e voamos de volta a Vilanculos. De volta ao "mini-aeroporto do Porto" lá estava o nosso Volvo à espera. O nosso destino de hoje era o hotel Flamingo Bay em Inhambane, outra cidade costeira e que recebeu o seu nome com a chegada do Sr. Gama, em 1498, significando "Terra da Boa Gente". Pelas fotografias disponíveis na internet, antevia-se outro encontro com o Paraíso, mas chegando lá foi como ficar a um passo do céu.

Pelo caminho passamos pelo trópico de Capricórnio (outra estreia para mim), é engraçado como até aqui, no meio de África, isso está marcado na estrada. Curiosamente, já tinha reparado no Malawi a presença de placas castanhas junto à estrada, informando os viajantes que se encontravam perto de património cultural/arqueológico/arquitectónico, tal e qual como em Portugal. Infelizmente os horários são muito apertados e não temos tempo para parar ou fazer desvios. Certamente que passamos por lugares únicos e/ou marcos importantes para a história da Humanidade. O roadbook contém algumas informações sobre os locais onde vamos passando (e que eu tento transmitir aqui), o que me vai satisfazendo o meu bichinho curioso.

Chegando a Inhambane encontramos uma cidade com traços do colonialismo português na sua arquitectura. A vila desenvolveu-se numa espécie de península, junto à baía de Inhambane, e o nosso hotel encontra-se sobre a água. Ou pelo menos assim parecia na internet. Na realidade é sobre um mangal, uma espécie de pântano, que se regula pelas marés e deixa um aspecto desolador na maré vaza. O tempo também não ajudou, visto que estava um vento forte, desencorajador a qualquer tipo de banho durante a maré alta. No entanto tem piada a maneira de como o hotel está organizado, têm o edifício principal na costa e depois umas passadeiras com cerca de 100 metros sobre o mangal encaminham-nos aos quartos. Nestas passadeiras circulam uns carrinhos de Golf que ajudam os hóspedes a fazer a travessia. À noite teve lugar um jantar no edifício principal, onde o meu Pai e eu ganhamos uma medalha pelo nosso tempo na secção especial à saída da Gorongosa.

Deixar o paraíso nunca deve ser fácil para ninguém, para mim, o dia de hoje foi como descer ao purgatório.

Até amanhã

Dia 13 - Um Dia no Paraíso

26 de Agosto, 2011
Ilha de Bazaruto, Moçambique

Começo por vos perguntar, como acham que é passar um dia no Paraíso? Já formaram a vossa ideia? Então vou vos contar como foi o meu.

Ao acordar o céu estava cinzento e pouco convidativo à praia (durante o dia o sol furou as nuvens e melhorou). O pequeno almoço estava óptimo com uma grande variedade de pastelaria, panquecas, ovos (mexidos, esfalfados, cozidos e estrelados), salsichas, feijão, fruta e sumos naturais. Apenas ficaram a faltar os famosos camarões na chapa, mas ainda tinha o almoço e o jantar para os deliciar.

Depois fui dar uma vista de olhos pelas diversas actividades que o hotel tem disponível a ver se escolhia alguma coisa. A variedade é imensa, desde passeios a cavalo, pesca em alto mar, caça submarina, passeios de barco, cayak, gaivotas, mas fiquei-me por uma máscara e um par de barbatanas para um eventual snorkelling em frente ao hotel. Apesar de o tempo ainda não ser o ideal, pus protector e fui até à praia ler um novo livro oferecido pelo meu Pai, "Drawn from the plains" de Lynne Tinley, e retrata a história dela e do marido que viveram durante alguns anos no Parque Etosha, Namíbia, e mais tarde mudaram-se para a Gorongosa. Quando os primeiros raios de sol espreitaram, foi altura de ir experimentar a água e aproveitar a maré vaza para procurar um dos meus animais marinhos favoritos, o São Bernardo Ermita. Estes pequenos animais (crustáceos?) procuram por conchas abandonadas e depois acabam por viver nelas. São verdadeiros "ocupas". Começou então a cheirar a camarão na grelha, o que indicava que o almoço estava pronto. Era um buffet e estava fantástico. Tinha tudo, desde pizza a salada de queijo feta. Desconfio que este é um passeio gastronómico disfarçado de rally de clássicos!

Da parte da tarde decidi-me então a experimentar a máscara e as barbatanas, e seguindo os conselhos do empregado que mas emprestou, fui à procura de um poço onde poderia encontrar alguns peixes interessantes. Tirando os recifes, que se encontram a cerca de 200 metros da costa, o poço revelou-se uma excelente alternativa. Trata-se de uma depressão na areia, mesmo em frente ao meu quarto, e que tem no seu interior o que será os restos de um pequeno barco. Não tinha todos aqueles peixes tropicais característicos dos corais, mas acabei por encontrar peixes bonitos. Alguns tinham umas riscas azul-néon, outros eram daqueles grandes, gordos e feios que estão sempre junto ao chão. Para os restos de um barco não estava nada mal. Vi também um coral, num tom azul-néon, e o que me pareceu ser um peixe-leão, mas também não fiquei para confirmar, pois é venenoso! Ao sair de água o céu já estava limpo e deu para aproveitar uns banhos de sol até ao fim do dia.

O jantar foi novamente buffet, com mais camarão à mistura, e também algum dos peixes que foram pescados de manhã por participantes do rally. Estava delicioso! Chegou então a hora de ir para a cama, que amanhã cedo tenho de apanhar um avião para o mundo real novamente.

E agora pergunto, como seria o vosso dia no Paraíso?

Até amanhã

01/09/11

Dia 12 - A Ilha

25 de Agosto, 2011
Ilha de Bazaruto, Moçambique

Esta manhã fomos acordados com uma leve "murrinha" (ou "morrinha"), tal e qual aquela que por vezes se mostra nas manhãs do Porto. Foi agradável pois impediu que ficasse muito calor rapidamente e também ajudou a reduzir o pó na estrada. Logo após o portão do parque tivemos direito a uma secção especial cronometrada, para "matar o bicho" das corridas. Correu bem e acabamos por conseguir o melhor tempo da nossa categoria, que são 4 carros apenas, mas um primeiro lugar é sempre um primeiro lugar!

O nosso objectivo de hoje era chegar ao aeroporto de Vilanculos, uma cidade à beira-mar e que ficava a 460km da Gorongosa. Felizmente não houve avarias e foi possível desfrutar da paisagem. Ao longo do caminho são perceptíveis algumas diferenças entre o interior de Moçambique e o seu litoral. Desde logo a paisagem que começa a perder o seu aspecto árido de savana e passa a ser mais húmido, com maiores terrenos cultivados, muitas bananeiras e também as primeiras palmeiras. Ao nível humano também há um melhoramento, as aldeias são maiores, com melhores casas (novamente vendidas às redes de telecomunicações), vêem-se mais motos, carros e camiões, e as pessoas parecem adoptar um estilo mais urbano e menos rural. Desde Dar es Salaam que não via o Índico e ao chegar a Vilanculos foi bom vê-lo de novo.

Ver o aeroporto de Vilanculos é como olhar para um desenho onde só estão frutas e ver lá um legume: não encaixa no ambiente em que está inserido. É totalmente novo, inaugurado à uns meses e construído por chineses (eles estão em todo o lado em África). Por fora é como uma escala minúscula do aeroporto do Porto, possui o mesmo género de arquitectura, moderna e branca. Como tínhamos de apanhar um avião para a ilha de Bazaruto e o aeroporto ainda não tem computadores (!?) o check in foi feito à mão (inédito para mim). É esquisito descrever como funciona o aeroporto mas imaginem como algo moderno e onde os funcionários fazem as coisas porque vêem fazê-las no estrangeiro. É uma sensação difícil de transcrever aqui. De qualquer forma, com o check in feito entramos numa avioneta para irmos até à ilha.

A viagem é rápida, cerca de 20 minutos, e visto do céu parecia que estava a ser levado para o Paraíso. A vista é simplesmente fenomenal. Tenho muita pena de não conseguir neste momento colocar fotos aqui (não as consigo editar e baixar o tamanho), mas acho que nem uma boa fotografia consegue fazer justiça à beleza que se vê de cima. Ao chegarmos fomos recebidos com uma limonada caseira e um almoço buffet, onde destaco os camarões. De resto foi o prato principal nas minhas refeições de hoje, camarão grelhado em chapa e com um bocadinho de limão. Que maravilha! A praia de areia branca e água azul turquesa,convidou-me a passar lá a tarde e eu aceitei. Estou rendido aos encantos desta ilha. É um paraíso na Terra. E eu estou nele durante dois dias!

Até amanhã



Dia 11 - Um Espaço Perdido

24 de Agosto, 2011
Parque Nacional da Gorongosa, Moçambique

Esta manhã fui recebido ao sair do quarto por um babuíno que por ali passava. Para perceberem melhor o enquadramento, não estamos hospedados num hotel mas sim em diversas cabanas naquilo que em tempos foi o campo de Chitengo. Apesar do campo estar vedado alguns animais menos envergonhados passeiam-se (sempre a uma margem de segurança) pelo campo procurando comida. Durante o almoço foi possível observar uma família de javalis a passarem à nossa frente e irem beber água a um bebedouro perto da piscina.

A seguir ao pequeno almoço fui dar uma pequena volta pelo campo para tentar ver se apanhava algum animal mas tirando a família de javalis nada feito. Aqui a partir das 9h fica muito calor e a maioria dos animais retiram-se e procuram a sombra das árvores até o sol se pôr. Chitengo e o Parque da Gorongosa foram muito afectados pela guerra civil que se iniciou após a independência. Até essa altura este Parque era dos mais importantes em África, reconhecido em tudo o mundo pela sua abundância de fauna e recebeu muitos visitantes famosos, incluindo John Wayne e os astronautas da missão Apollo.

O Parque foi criado na década de 20 com o intuito de ser uma reserva de caça para a empresa Mozambique Company e em 1960 foi tornado Parque Nacional pelo governo português. Começou com apenas 1000 km², sendo que na década de 60 já se estendia por 5300 km² (actualmente creio que tem cerca de 25000 km²). O que marca a diferença entre os tempos áureos do Parque e o seu actual estado é a fauna. Vejamos os números:

Observações aéreas realizadas em 1976, portanto após a independência, demonstraram que viviam no Parque cerca de 6000 elefantes, 500 leões, 3500 hipopótamos, mais de 400 espécies de aves, 1800 búfalos, 2900 waterbucks e inúmeras manadas de outros animais como rinocerontes, impalas, zebras e outros. O Parque fechou em 1982 devido à guerra civil entre a Frelimo e a Renamo que durou até 1992. Em 1996 voltaram-se a realizar observações aéreas e apenas encontraram 19 elefantes, 13 búfalos, 10 hipopótamos e nenhum rinoceronte! Leões, chitas, leopardos e wild dogs desapareceram também. Apenas restaram os javalis e crocodilos. Chocante!

Depois do almoço participei num Game Drive numa tentativa de explorar as maravilhas do Gorongosa. O parque é realmente fantástico, aqui a paisagem assemelha-se mais à África dos domingos de manhã, que passa na Sic, com grandes savanas planas e poucas árvores. No que se assemelha em paisagem peca nos animais É visível a falta deles e ao mesmo tempo é fácil de imaginar as planícies de aluvião cheias de manadas de herbívoros a deslocarem-se em busca de novas e verdes pastagens. O nosso motorista, o Adolfo, levou-nos a um ponto elevado onde era possível ver de um lado o pôr-do-sol e do outro os animais a deslocarem-se na planície. Foi simplesmente mágico.

A Gorongosa foi um espaço que se perdeu e o futuro não parece animador, os caçadores furtivos continuam a entrar no Parque e companhias chinesas de exploração mineira que se encontram junto à Gorongosa estão a dar cabo do ecossistema. No entanto acredito que a Natureza consegue dar a volta e que o Parque vai recuperar a riqueza de antigamente.

Até amanhã